sábado, 11 de abril de 2020

O mundo está à beira de uma nova grande crise econômica sem precedentes, com a maioria das nações vulnerareis,

Instituições como FMI e Banco Mundial reduziram  suas previsões para o crescimento da economia global.

Urias Rocha

Nos últimos meses, os sinais de preocupação com a economia mundial têm se acumulado: analistas apontam para crescentes riscos de crise no horizonte e organizações internacionais vêm reduzindo suas projeções de crescimento global.
Em janeiro, o FMI (Fundo Monetário Internacional) revisou sua previsão de crescimento global de 3,7% para 3,5% neste ano e de 3,7% para 3,6% em 2020. O Banco Mundial também recalibrou sua estimativa de avanço da economia mundial para 2,9% neste ano, 0,1 ponto percentual abaixo da projeção de junho passado.
O clima de ansiedade era visível em Davos, na Suíça, onde líderes políticos e empresariais estiveram reunidos no último mês para o Fórum Econômico Mundial. Um levantamento recente do grupo de pesquisas Conference Board revelou que a possibilidade de recessão global é a principal preocupação dos mais de 800 CEOs consultados em diversos países.
Mas será que o mundo realmente se encaminha para uma nova grande crise econômica?
A diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, alertou em Davos que, após dois anos de sólida expansão, a economia mundial está crescendo mais lentamente do que o esperado e os riscos estão aumentando.
"Isso significa que há uma recessão global dobrando a esquina? Não. Mas o risco de um declínio mais acentuado no crescimento global certamente aumentou", ressaltou.
Na avaliação da diretora-executiva de Economia Global da consultoria IHS Markit, Sara Johnson, o perigo de declínio global cresceu, mas a probabilidade de recessão em 2019 ainda é baixa.
"Nós vemos a recente desaceleração no crescimento como parte do ciclo econômico normal. Diversas partes do mundo, incluindo os Estados Unidos e a Europa, estavam crescendo mais rápido do que sua tendência de longo prazo", disse Johnson à BBC News Brasil.
Ela salienta que, nos Estados Unidos, os benefícios do corte de impostos do final de 2017 ainda estão alimentando o crescimento, e a expansão da economia americana é um dos fatores pelos quais ela não vê uma recessão mundial no curto prazo.
"Mas, obviamente, toda expansão um dia acaba."

Desaceleração nos Estados Unidos

A maior economia do mundo registra seu segundo maior ciclo de expansão contínua, iniciado em junho de 2009, mas analistas apontam para riscos em meio ao aumento das taxas de juros, tensões comerciais, especialmente com a China, recentes turbulências no mercado financeiro e o impacto econômico da paralisação parcial recorde do governo federal.
O corte de impostos ajudou a impulsionar a economia americana em 2018, com crescimento de 2,9%, mas o impacto da medida tende a enfraquecer gradualmente. O FMI prevê avanço de 2,5% em 2019 e 1,8% no ano seguinte, projeção inalterada desde outubro.
O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) aumentou a taxa básica de juros quatro vezes no ano passado, a última delas em dezembro, em 0,25 ponto percentual, para o intervalo entre 2,25% e 2,50%. A alta dos juros ajuda a controlar a inflação, mas afeta o crescimento da economia, ao incentivar a poupança e reduzir consumo e investimento em produção.
Os aumentos recentes foram criticados pelo presidente Donald Trump como prejudiciais à economia do país, o que acabou gerando preocupação de influência indevida do líder americano, ameaçando a independência do Fed, que recebe do Congresso a responsabilidade sobre a política monetária.
No último dia 30, o Fed decidiu manter o atual patamar de juros e sinalizou que não antecipa novos aumentos. A inflação americana se mantém perto da meta de 2% ao ano, e o mercado de trabalho, outro indicador da saúde da economia, continua sólido, com 2,6 milhões de empregos criados em 2018 e taxa de desemprego de 3,9%.
"Uma maneira de interpretar (a opção por dois aumentos) é que estão preocupados em aumentar muito a taxa de juros e provocar uma recessão", disse à BBC News Brasil a economista Kathryn Dominguez, professora de Economia e Políticas Públicas da Universidade de Michigan e pesquisadora do Escritório Nacional de Pesquisa Econômica.
Outro risco destacado por analistas são as tensões comerciais entre os Estados Unidos e a China, com aumento de tarifas, que afetam o resto do mundo e já haviam provocado uma revisão para baixo nas projeções anteriores do FMI para a economia global, divulgadas em outubro.
Caso os dois países não resolvam a disputa, as tarifas já impostas pelos Estados Unidos a uma gama de produtos chineses podem subir de 10% para 25%, provocando nova retaliação da China. Além da briga com a China, o governo americano também enfrenta tensão com vários outros parceiros comerciais, com a imposição de tarifas sobre a importação de aço e alumínio.

China dá sinais de alerta

O desempenho da economia chinesa também é motivo de preocupação. Em janeiro, a China anunciou crescimento de 6,6% em 2018, menor taxa desde 1990. A previsão do FMI é de avanço ainda menor, de 6,2%, neste ano e em 2020.
"Enquanto eu espero que a China continue a crescer em ritmo sólido neste ano, alguns problemas estão se formando, entre eles alto nível de endividamento, excesso de capacidade em algumas indústrias pesadas e mercados imobiliários", ressalta Johnson.
"Claramente o setor industrial está enfrentando dificuldades no momento."
O governo chinês planeja medidas de estímulo, incluindo cortes de impostos e investimento em infraestrutura. "Isso será crucial", destaca Dominguez.
"A China responde por grande parte da decisão (de organizações internacionais) de reduzir as projeções para o crescimento global, representa uma importante parcela do crescimento global."
A economia europeia também enfrenta riscos que podem afetar a economia mundial, com as dificuldades de acordo para a saída do Reino Unido da União Europeia (o chamado Brexit) e a desaceleração na zona do euro, cujo crescimento neste ano foi revisado pelo FMI para 1,6%, queda de 0,3 ponto percentual em relação à projeção de outubro.
A Alemanha ainda se adapta às novas regras de emissões de poluentes para automóveis, que afetaram essa indústria. A França registra violentos protestos nas ruas há mais de dois meses. E, na Itália, "preocupações com riscos soberanos e financeiros tiveram impacto na demanda interna", disse o FMI.

Outros riscos

Problemas nos Estados Unidos, na China e na Europa costumam afetar mercados emergentes, como o Brasil, mas Dominguez afirma que ainda é cedo para calcular o possível impacto de uma desaceleração mais acentuada.
No caso do Brasil, Johnson observa que é importante ver o que acontece com as reformas, como a da Previdência.
O FMI prevê crescimento de 2,5% na economia brasileira neste ano, 0,1 ponto percentual a mais que a previsão de outubro e semelhante aos 2,53% do relatório Focus, do Banco Central, feito a partir de pesquisa semanal com consultorias e instituições financeiras. Para 2020, a previsão do FMI é de 2,2%, abaixo dos 2,6% do Focus.
Analistas citam ainda outros motivos de preocupação para a economia mundial, como o alto nível de endividamento global e a política mais polarizada em diversos países. Mas Dominguez diz que as reduções nas perspectivas de crescimento global feitas pelas principais organizações internacionais ainda são modestas.
"Não é impossível que vários desses potenciais choques negativos se acumulem e levem a uma desaceleração mais dramática do que as previsões indicam atualmente. Mas certamente não há um consenso hoje de que isso deve ocorrer em 2019."
A economista lembra que 2018 e, principalmente, 2017, foram anos muito bons para a economia global. "Parte do que estamos vendo é simplesmente uma desaceleração em relação a dois anos muito bons", afirma Dominguez.
"Pode ser que estejamos voltando ao normal, e esse normal seja mais lento do que nos últimos anos. Mas isso é diferente de dizer que estamos entrando em uma recessão global."

Urias Rocha - Mato Grosso do Sul - Brasil

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